Geomembranas, mineração
Manta de geomembrana de polietileno de alta densidades (PEAD), estrutura de contenção de resíduo de mineração no deserto de Gobi. Foto de Gassner e Wrench.

Neste artigo, publicamos um resumo de Geossintéticos em Aplicações de Mineração: O Que Temos Aprendido?” do artigo da palestra de autoria do Prof. Bouazza, Will Gates (SmecTech, Monash University) e John Scheirs (ExcelPlas). O artigo completo e a apresentação estão disponíveis nos anais do GeoAfrica 2013. Nesta Parte 1, o uso de geossintéticos em contenção é abordado. Na Parte 2 (em breve), o foco é em reforço.  – Chris Kelsey, Editor, Geosynthetica.
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O uso de geossintéticos em várias operações de mineração está aumentando rapidamente. Enquanto eles não são facilmente aceitos como na indústria da engenharia civil, o crescimento na indústria da mineração está ocorrendo, pois os operadores começam a entender as vantagens associadas ao uso destes materiais. Os intervalos extremos das propriedades dos resíduos gerados nos processos de extração de minérios, os severos ambientes aos quais os geossintéticos são expostos e as cargas normais extremamente altas as quais eles são submetidos, são extremamente desafiadores.

GEOMEMBRANAS: DEPÓSITOS DE REJEITOS E INSTALAÇÕES DE CONTENÇÃO

Geomembranas, mineração
Foto de geomembrana quimicamente atacada

Geomembranas são projetadas como uma proteção relativamente impermeável e têm sido utilizadas extensivamente, ao longo das últimas duas décadas, em sistemas de barreiras para instalações de contenção de resíduos para um grande espectro de resíduos, incluindo resíduos de mineração. Geomebranas têm se tornado um componente crítico em instalações de mineração onde a performance de contenção foi comprovada. Nisto incluem-se proteções de base para depósitos de rejeitos, proteções para bacias de concreto e proteção de tanques, lagoas de evaporação para recuperação de sal, proteções expostas temporárias ou “capas de chuvas” para regiões tropicais, proteção intra-camada em depósitos de rejeitos, proteções para mitigação de drenagem de mina ácida de rejeitos ou depósito de resíduo de rocha e para represamento e processamento de resíduos.
Smith (2008) indicou que há uma forte correlação entre a produção de metal e a demanda por geomembrana e que ambas estão relacionadas e atreladas a fatores econômicos similares. Além disso, reiterou o fato de que esta relação deverá continuar e ser ampliada com o aumento do uso de depósito de rejeitos e a diversificação de aplicações como o controle de drenagem de rejeitos e mina ácida.
Depósitos de rejeitos são geralmente construídos utilizando ao máximo a topografia natural local numa variedade de climas, variando desde o clima ártico (temperaturas tão baixas quanto -30oC), tropical chuvoso (chuva excedendo 2,5 m/ano) ao clima seco do Saara (temperaturas tão altas quanto +50oC) e em altitudes acimas de 4000 m (Alto dos Andes na América do Sul). A área do depósito é escavada e aterrada o necessário para obter um talude de inclinação 0,5 a 1 %. Geomembranas de PEAD ou PELBD entre 1 e 1,5 mm de espessura são normalmente utilizadas para a base do depósito e 2-3 mm de espessura nos poços coletores e drenos. Diretamente sobre as geomembranas, são instalados tubos de drenagem (geralmente de PEAD), os quais são cobertos por uma camada de proteção de solo granular de quase 60 cm de espessura para proteger o sistema geomembrana-tubos durante a deposição dos minérios. Contrário à prática na indústria de aterros sanitários, camadas de proteção de geotêxtil são raramente usadas em depósitos de rejeitos de minério.
Geossintéticos em Aplicações de Mineração
Exemplo de configuração de banco de estabilidade em degraus numa bacia de rejeitos de mineração com barreira composta

O material da geomembrana é apto a reter soluções químicas usadas para dissolver os minerais dos minérios e a permitir que o lixiviado seja coletado e refinado. Rejeitos de minérios apresentam uma combinação de pressões extremas na base e condições de alta umidade/acidez na geomembrana que não são encontradas em nenhuma outra aplicação de contenção. Estas condições extremas ultrapassam o limite de performance de geomembranas recomendado em projetos gerais, incluindo depósitos  ³ 100 m de altura, carregamento de equipamentos de até 53 toneladas por roda, colocação de agregado graúdo sobre a membrana, exposição a concentrados ácidos ou alcalinos, pressões hidráulicas de até 60 m, potencial de liquefação e climas áridos severos com extremos de temperaturas diários (Thiel e Smith, 2004). A ação combinada de soluções agressivas e temperaturas próximas de 60oC a 70oC na superfície exposta de uma geomembrana pode seriamente enfraquecer a maioria dos materiais de geomembrana. Além disso, o depósito de minérios na membrana faz com que seja necessário que a geomembrana seja forte e flexível, portanto, resistente a punções e abrasões. Finalmente, o projeto íngreme e angular de lagoas de coleta exige um produto forte e durável. Para estruturas de mineração protegidas com geomembranas sujeitas a carregamentos moderados a altos (maiores que 300 kPa), materiais de geomembranas como PEAD, PELBD, e (em um grau menor) PVC são utilizados, principalmente, por causa da experiência da indústria com estes materiais e performances documentadas de estruturas de mineração. Porém, depósitos de rejeitos revestidos com geomembrana estão sendo projetados com alturas de minérios aproximando-se dos 240 m, resultando em estresses normais que excedem 4 Mpa (Lupo 2010), apresentam neste contexto novos desafios para a indústria de geossintéticos.
A mineração é a atividade principal de muitas economias ao redor do mundo, inclusive de países desenvolvidos como a Austrália. Em muitos países em desenvolvimento, a mineração provê mais de 50% dos ganhos de exportação. Por exemplo, em Papua-Nova Guiné representa 66% dos ganhos (Fourie et al. 2010) em comparação com os 42% da Austrália (MCA, 2009). Portanto, não é surpresa que a indústria da mineração é frequentemente tida como a maior produtora de resíduos sólidos em todo o planeta, algumas vezes ordens de magnitude maior que outras formas de resíduos sólidos (ex. Resíduo sólido municipal). Ao se considerar que para resgatar uma ou duas gramas de ouro, uma tonelada de mineral da rocha matriz necessita ser esmagada e processada, e pelo menos outra tonelada de resíduo de rocha é produzido; uma ideia pode ser formada da enormidade do problema da gerência de resíduos encarada pela indústria de mineração.
Na Austrália, a produção total anual de resíduo de minério em 2012 foi de aproximadamente 6,5 bilhões de toneladas, fazendo com que a escala de aterros sanitários se pareça insignificante com apenas centenas de milhões de toneladas (Mudd, 2013). Blight (2010) relatou que a indústria de mineração sulafricana produziu 740 mil toneladas de minério de ouro na década de 1997 a 2006. Até 2000, o total de resíduos de mineração despejados de esteiras na China eram de aproximadamente 5026 milhões de toneladas. Depois 2000, o total anual de resíduos de mineração alcançou aproximadamente 600 milhões de toneladas (Shen et al., 2011).
Uma proporção considerável da indústria de mineração tem mudado para técnicas de mina aberta em grande escala o que, invariavelmente, requer a remoção de quantidade significativa de resíduo de rochas. Junte-se a isso a tendência geral de degradação do grau de pureza do minério, o que resulta em quantidades maiores de minério a serem processadas para produção de uma certa unidade de metal ou mineral (Mudd, 2009). Fourie et al. (2010) indicaram que quando são considerados os enormes volumes de resíduos de mineração produzidos anualmente, e os potenciais riscos ambientais associados ao armazenamento destes resíduos, é impressionante notar que a vasta maioria do uso de geossintéticos não é relacionada a esta aplicação. O uso de geossintéticos nesta indústria está relacionado à atividades de produção (depósitos de rejeitos, etc.). Christie e Smith (2013) indicaram que essencialmente 100% dos depósitos de rejeitos são revestidos por pelo menos uma geomembrana, e o depósito de rejeito médio atualmente excede 1 milhão de m2 em área de proteção. Os autores também indicaram que na indústria do cobre menos de 1% da área de estruturas para rejeitos é protegida por geomembranas. Para ouro, este número era maior e está crescendo, porém continua abaixo de 50%. Isto não é totalmente uma surpresa, porque as empresas estão no negócio da mineração para obter lucro e qualquer coisa que aumente a produtividade em grandes chances de ser adotada em sua plenitude. Por outro lado, a proteção ambiental é simplesmente um custo adicional e não gera influxo de dinheiro.
Resíduo de minério vem em duas formas primárias: resíduo de rocha e de minérios. Em qualquer operação de mineração, para acessar a valiosa rocha mineral, é necessário primeiramente retirar ou escavar rocha não-mineral. Esta rocha, que é fragmentada durante os processos de perfuração, explosão e escavamento, é despejada em áreas específicas para despejo de resíduos de rocha. Resíduos de minério, por outro lado, são o subproduto dos processos de esmagamento, fresagem e extração química utilizados para recuperar o mineral valioso sendo processado. Resíduos de minérios são geralmente do tamanho de grãos de areia ou mais finos, e são gerenciados por bombeamento a baixas concentrações de sólidos e depositados em represamentos específicos conhecidos como Estruturas de Depósito de Resíduos de Minérios (EDRMs ou TSFs, abreviação em inglês). O depósito destes grandes volumes de resíduo de rocha e de minério resulta em estruturas de armazenamento que cobrem grandes áreas de terreno. Algumas das EDRMs de areias de óleo excedem 100 hectares, e áreas excedendo 120 hectares não são incomuns com metais de base, como operações de ouro e platina (Fourie et al., 2010). Resíduos sólidos são na maioria dos casos misturados com água e bombeados para a estrutura de depósito de resíduos de minérios (EDRM), algumas vezes em grandes distâncias (mais de 5km). Como depósito, grandes volumes de água são separados do material sólido, e esta água deve ser armazenada e gerenciada de modo que não hajam riscos ao meio ambiente. Ao contrário de aterros sanitários, em que o gradiente do lixiviado no sistema de proteção é restrito, usualmente entorno de 0.3m; o gradiente hidráulico atuando numa proteção de EDRM pode ser de vários metros. EDRMs estão cada vez mais sendo protegidas para minimizar a possível migração dos contaminantes. Dillon et al. (2004) fornecem detalhes da maior estrutura de armazenamento de resíduo de minérios totalmente protegida (geomembrana + GCL) na Europa, localizada na Irlanda. Lupo (2009) indicou que várias EDRMs foram protegidas nos Estados Unidos. Fourie et al. (2010) indicou que locais de depósito de resíduo de bauxita, de alto pH e carga de sal do lixiviado, frequentemente associados a proximidade de áreas residenciais têm levado a empresas de mineração como Alcoa World Alumina e BHP-Billiton a voluntariamente implementar a instalação de sistemas de proteção.

INTERAÇÃO DE GCL COM RESÍDUOS DE MINERAÇÃO

Geossintéticos em Aplicações de Mineração
Cristal de Esmectita (partícula fundamental da montmorilonita). Os valores da distância “d” de 1,2 – 40 nm para montmorilonitas de sódio (Na+) são uma medide unidimensional de dilatação da argila. A distânce intercamada (e volume) aumenta com a absorção, ou diminui com a liberação, de água pela intercamada de cátions e de superfícies cristalinas (de Bouazza e Gates, 2013).

A escassez de jazidas adequadas e econômicas de solo argiloso para barreiras impermeabilizantes (ou liners) tradicionais (isto é camadas de argila compactada) em locais de mineração tem resultado no aumento recente do interesse em materiais alternativos para barreiras hidráulicas, como os geocompostos argilosos para barreiras (GCLs). Assim como em outros sistemas de barreiras impermeabilizantes, a aplicação de GCLs num ambiente de mineração (por exemplo: liners de estruturas de usina de urânio, lagoas de evaporação de salmoura, depósitos de resíduos de rocha, etc.), geralmente leva a performance da barreira a níveis superiores que os limites típicos recomendados para outras aplicações ambientais e de engenharia (Gates et al. 2009, Bouazza and Gates 2013).
Nosso entendimento do comportamento de geocompostos argilosos para barreiras (GCLs) em contato com lixiviados de resíduos de mineração ou licores de processamento e águas de fornecimento está crescendo conforme mais pesquisas se tornam disponíveis. Processos industriais e de mineração produzem enormes volumes de resíduos líquido e semi-sólidos que geralmente possuem valores extremos de pH e força iônica. Alta força iônica e pH extremo não sempre resultam em perda de performance da barreira de GCL. A complexa interação de altos níveis de íons dissolvidos, frequentemente perto da saturação termodinâmica e mudanças do pH do lixiviado em contato com a bentonita do GCL pode, em alguns casos, resultar em reações de preenchimento de poros (Benson et al., 2010; Gates e Bouazza, 2010; Shackelford et al., 2010; Helios-Rybika e Wójcik, 2012).
A compatibilidade de  química de longo termo de GCLs é um importante aspecto que tem recebido atenção no passado, porém mais estudos necessitam focar em rejeitos de mineração, lixiviados e licores específicos a aplicações em mineração (Gates et al., 2009; Benson et al., 2010; Hornsey et al., 2010; Shackelford et al., 2010). GCLs geralmente possuem baixa condutividade hidráulica (< 5 x 10-11 m/s) a água de torneira pois, na maioria dos casos, os GCLs contêm benonita de Sódio (Na+).
Apesar das bentonitas de sódio serem capazes de se dilatarem várias vezes seus volumes originais, o confinamento imposto pela sobrecarga reduz o tamanho dos poros interpartículas (Likos e Lu, 2006) e, portanto, o volume de vazios ativamente envolvido no fluxo. Porém, se o Sódio (Na+) é trocado por cátions com maior carga (por exemplo, Ca2+ ou Mg2+, os quais são comuns em lixiviados), a maioria da dilatação é limitada e a bentonita pode se transformar em ordens de magnitude mais permeável (Shackelford et al. 2000; Jo et al. 2001). Em baixas concentrações, os processos de trocas de cátions ocorre lentamente devido a limitações de transferência de massa (um fenômeno de difusão limitada) que ocorrem entre a maioria da água nos poros e a camada de água entre camadas de montmorilonita (Jo et al., 2006). Ensaios de laboratório de condutividade hidráulica em GCLs utilizando soluções diluídas (< 0.1 M)de CaCl2 relatados por Benson (2001) mostram que após quase um ano de permeação, o equilíbrio hidráulico ainda não tinha sido estabelecido e a condutividade hidráulica continuava a aumentar gradualmente. Esta observação sustenta a importância de pré-hidratação do GCL – um GCL pré-hidratado, se mantido num estado saturado durante a permeação, pode efetivamente minimizar a transferência de lixiviados.

Agradecimentos: Aplicações de mineracao

Parte das informações contidas no artigo completo dos autores é baseada numa palestra de abertura preparada em colaboração com Prof. A. Fourie (UWA, Austrália), Dr. J. Lupo (Newmont, EUA) para a 9a Conferência Internacional de Geossintéticos (Maio de 2010). Suas contribuições são encarecidamente reconhecidas. Estudos de caso em aplicações de reforço em projetos de mineração foram gentilmente fornecidos por Geofabrics Australasia Pty. Ltd., os autores são gratos pela ajuda.
Para referência completas e o artigo de 31 páginas, consulte os anais da GeoAfrica 2013.
A. Bouazza (malek.bouazza@monash.edu) e W.P.Gates (will.gates@monash.edu) são do Dept. De Engenharia Civil, Universidade de Monash, Austrália.
J. Scheirs (john@excelplas.com) trabalha para a ExcelPlas Pty. Ltd., Melbourne, Austrália